"Não canso de dizer: o ballet é a minha segunda pele".

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Um pouco da minha história contada através dos meus personagens

Libreto Onegin
A história de “Eugene Onegin”, é uma proposta de reencontro personagem/ intérprete, alternados entre vida real e ficção, em que o personagem principal é o próprio compositor.
Tchaikovski faz do Palco sua sala de estar e encontra na interpretação de Cecília Kerche uma espécie de confissão musical da alma.
Estabelece-se um diálogo entre compositor e intérprete, em que Tchaikovski transmite à Cecília uma cumplicidade de entendimento, nas ações e sentimentos. Não é mais ele quem conta a sua história, mas a sensibilidade de Cecília Kerche transformada em arte, torna visível “ouvir” a música de Tchaikovski através de seus gestos e movimentos.
“Eugene Onegin”, pode ser considerado um dos mais belos momentos de inspiração na criatividade do compositor Ilich Piotr Tchaikovski, que retrata uma realidade particular, porém de forte identificação pessoal ao espectador.
O paradoxo entre a ingenuidade sentimental e a arrogância frívola dá à obra um conteúdo essencialmente dramático.
Ao ler o poema de Alexander Pushkin - ilustre poeta russo do final do séc.XVIII, antecipando o romantismo do séc.XIX, Tchaikovski provoca um movimento linear das atitudes identificando-se com a aparente fragilidade da personagem Tatiana, trazendo para sua realidade todo universo de uma vida de sentimentos nobres, envolvidos em valores.
A temática do drama de Pushkin, propõe à humanidade, uma reflexão sobre sentimento e ressentimento, egoísmo e generosidade, destino e fatalidade.
Diferentemente do romance de Pushkin, no cotidiano de Cecília Kerche, não há espaço para ressentimento, devido à uma generosidade espontânea de enfrentar as dificuldades que a vida apresenta.
Há muito que fazer, não estamos aqui para desperdiçar e sim para aprender, ensinar e de cada experiência boa ou ruim é possível tirar uma lição.
“Eugene Onegin” por ser uma obra do sentimento, proporciona a Cecília um modo muito particular de trazer a público esse universo tão pessoal de Tchaikovski, em que todo pensamento se faz acompanhar de um sentimento.
Uma disciplina diária de exercícios cuidadosamente orientados por seu mestre e marido – Pedro Krazszsuck. Uma história de amor na vida real que ultrapassa a ficção, na solidez de uma vida a dois iniciada pela sedução da arte de ambos. A sala de aula, entre uma barra e outra, a solitária descoberta íntima da bailarina, uma paulistana de coração carioca.
Não muito distante de sua personagem Tatiana entretida por seus livros e histórias, desperta para um mundo pessoal individual. É a solidão que a natureza na sua sabedoria requer, para dar vazão a liberdade tão criativa; a integração entre o eu humano e sua transcendência.
Tatiana é o desdobramento poético da personalidade de Cecília Kerche em sua máxima efusão dramática na liberdade de expressão da própria intérprete, que corresponde a essa “exigência” de entrega para compor sua personagem. Tatiana em sua juventude pueril, antecipa uma maturidade da jovem estudante que um dia decidiu ser a primeira bailarina do Teatro mais importante do seu país.
Alicerçada pela sólida formação familiar que recebeu, Cecília, assim como Tatiana na paisagem de sua fazenda não se deixa absorver por meros caprichos de sua irmã Olga. Existe em Tatiana uma objetividade sutil em seu modo de agir cotidianamente.
A jovem bailarina, sempre muita atenta às obrigações escolares e familiares, sendo a mais velha de três irmãos, tem sua vocação já definida enquanto acompanhava sua irmã nas aulas de ballet .
Não importava se a preocupação inicial de seus pais, bons educadores, exigisse um pouco mais da menina de temperamento dócil mas de personalidade determinante. Era uma rotina de sacrifício e muito aprendizado, pois para a família Kerche, os valores morais e éticos serviam de “motivo condutor” para toda vida.
Uma realidade passada de pais para filhos na aceitação dos percalços da vida, não de modo passivo e resignado, mas na busca do entendimento da própria existência, posteriormente aplicado ao limiar da auto-superação, nos desafios físicos/ emocionais vividos na arte do ballet.
Tatiana pode ser considerada a personagem de maior emoção interpretada por Cecília, devido à sua forte identificação com o teor dramático, teatral e romântico que esta personagem exige.
Apesar da responsabilidade inerente à sua privilegiada condição física ideal, reconhecida mundialmente para se ter uma carreira de sucesso e almejada por toda bailarina, essa identificação Tatiana / Cecília, torna-se para o público, uma conseqüência natural, mediante o verdadeiro motivo que conduz sua vida profissional e pessoal – o amor ao próximo.
O título de Embaixatriz da Dança ratifica as atitudes de Cecília em seu ambiente de trabalho, pois existem dois fatores preponderantes em sua atuação. O primeiro é sua visão de troca de emoção entre seu partner - ou seja , para que se chegue ao que o compositor e o coreógrafo desejam naquela obra que se está dançando é necessário uma total entrega, uma doação de parte a parte em cena, para que se possa responder ao personagem. O Poder transformador no palco requer despojamento e generosidade.
O coreógrafo John Cranko (natural da África do Sul – Ruatenburg, nascido em 1927 e falecido em 1973) cria para o ballet de Stuttgart – Onegin, que estreou no Brasil em 1979.
Em 2003 esta peça entrou para o repertório da Companhia de ballet do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, com reapresentação em 2004 e em 2006.
Onegin é um ballet de grande força teatral, pelas linhas e desenhos coreográficos comoventes na sua comunicação. Um drama de sentimento.
Tatiana ao olhar-se no espelho vê a imagem de Cecília Kerche - seu desdobramento de alma e sentimento - uma imagem nítida do poder transformador da arte que faz com que o espectador se identifique fortemente com uma realidade contada em forma de ficção.
Cecília Kerche nesse momento empresta à sua personagem toda experiência de viver uma grande paixão. Repete a atitude de Tatiana e ao invés de ver sua imagem, depara-se com a imagem de Onegin que vem ao seu encontro.
É a sombra na alma de Tchaikovski, que não encontra mais sentido na própria realidade e perde sua referência. É a luta pessoal do homem para dominar seu próprio destino.

Tchaikovski confidencia para Cecília no personagem Onegin, o seu momento de desânimo e grande decepção com a própria vida. A impotência para dominar sua insensatez, sua dependência em querer suportar o insuportável.
Onegin sente-se ferido e revida toda sensibilidade de Tatiana, hostilizando seus sentimentos e faz questão de se auto-afirmar, despedaçando todos os sonhos e sentimentos mais nobres externados em papel, nas linhas através da carta onde Tatiana bravamente narra seu sentimento por ele.
Tatiana recebe a rejeição de seus sentimentos como uma dor insuportável, quase física. É impossível acreditar que um homem tão importante e de certo prestígio como Onegin possa reagir a sentimentos tão nobres, com tanta sordidez e desprezo!
O desfecho da história criada por Tchaikovski, é a pergunta que muitos de nós poderíamos formular – É o homem o dono do seu próprio destino?
Porém não é o desfecho da vida de um homem que tem tanto para contar e ensinar a humanidade.
Em Cecília Kerche e Tchaikovski há um encontro de almas que com o passar do tempo seremos capazes de descobrir através de seus personagens. Vida e obra de compositor e intérprete vão compondo um grande “pas des deux”.
Cecília é adversa a qualquer tipo de comportamento mesquinho, que fira seus princípios e a injustiça a machuca profundamente.
Na verdade, Cecília tem uma carreira impecável referente à sua atuação, mas vale dizer que sua impecabilidade se mantém presente na habilidade imperceptível de colaborar para o sucesso alheio. Ela diz que o Sol brilha para todos!
Não lhe importa estar na mídia, porque o sentimento e a consciência que a motivam a dançar não se resumem numa ocasião, num determinado personagem, mas Cecília ao longo do tempo vem descobrindo que a sua carreira é um verdadeiro serviço ao ser humano. Como algo confiado desde sempre à sua condição de criatura humana. Ela é alguém que compreende a divindade de ser artista e por isso sabe que é preciso deixar que a arte realize seus propósitos através dela.


Biografia de Cecilia kerche - publicada no site www.portaldafamilia.org.br